O presidente da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados quer votar na próxima semana seu relatório sobre o projeto de descriminalização do aborto.

No relatório, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se posiciona contra o fim da pena de 1 a 3 anos de prisão, prevista no artigo 124 do Código Penal, para o crime de aborto. Para ele, o projeto é inconstitucional por “violar o direito à vida”.

Segundo a secretaria da comissão, caso o projeto seja rejeitado na CCJ com base na tese de inconstitucionalidade, pode ser arquivado. Se uma eventual rejeição acontecer após a análise do mérito, a matéria vai ao Plenário da Câmara. O mesmo ocorrerá em caso de aprovação. O projeto de lei em discussão é o 1.135, de 1991, que suprime o artigo 124 do Código Penal. Ele tramita em conjunto com o projeto de lei 175, de 1995, que prevê a liberdade de escolha da mulher e estabelece ainda que os hospitais públicos sejam obrigados a realizar o aborto.

Autor do projeto 176, o deputado José Genoino (PT-SP) avisou que vai obstruir “o máximo possível” a votação. Seu plano é adiá-la “pelo menos” até agosto. Neste mês, após o recesso de julho, o Supremo Tribunal Federal poderá julgar o aborto de fetos anencéfalos. “Vou adiar a votação o máximo que puder, porque acho que o assunto ainda precisa de muito debate e porque a gente perde aqui”, disse, referindo-se a CCJ.

A disputa na comissão já começou nesta quarta-feira, em audiência pública para debater o projeto. Durante a sessão, Genoíno avisou que vai apresentar um voto em separado, contrário ao do relator, e pediu aos parlamentares que não usassem a matéria como “bandeira eleitoral”. Cunha lembrou que a matéria ainda iria a plenário, ao que o petista respondeu que “poderia ir com um parecer favorável da comissão”. “Espero que não”, retrucou o presidente da CCJ.

O peemedebista ressaltou que “não tem dúvidas” sobre a inconstitucionalidade do projeto e acrescentou que “o debate de mérito já foi feito na Seguridade Social”. A comissão à qual o deputado se referiu rejeitou o projeto, no início de maio, por unanimidade de 33 votos, depois que os parlamentares favoráveis à descriminalização deixaram a votação, em protesto.

Outra audiência pública com representantes da sociedade civil e de movimentos religiosos será realizada na manhã desta quinta (3). Eduardo Cunha nega estar acelerando o processo e diz que a CCJ sempre vota com rapidez os projetos. “Inclusive aqueles sobre os quais eu sou contra”, destaca. Para o deputado, no caso da matéria sobre a descriminalização do aborto, “todo mundo já tem uma posição formada.” “A maioria da comissão, que é técnica do ponto de vista constitucional, deve ficar a favor do meu posicionamento”, concluiu.

O deputado Leonardo Picciani (PMDB-RJ) também acredita que os parlamentares contrários à descriminalização são maioria na comissão e defende a votação do relatório já na próxima semana. “O projeto é de 1991. Está mais do que na hora de ser votado”, defendeu.

Em audiência na Câmara, pesquisadora compara aborto a assassinato

A professora do Instituto de Biologia da UnB (Universidade de Brasília) Lenise Garcia comparou o aborto a um assassinato, ao falar sobre o caso da auxiliar de enfermagem que jogou a filha de 8 meses pela janela.

Nesta quarta-feira (2), a pesquisadora recém-eleita presidente do movimento Brasil sem Aborto participou de audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara. A sessão discutiu projeto de lei que prevê a descriminalização do aborto.

“Se eu não posso pegar um bebê matar, jogar pela janela, como fez uma mãe louca outro dia, por que eu poderia jogar um feto no lixo?”, questionou Lenise, que, na audiência, falou como representante da CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil).

“Fala-se do aborto legal como se nesse aborto não houvesse morte, sendo que em 100% dos casos há morte”, ressaltou, usando um mandamento bíblico para completar seu argumento. “Não é porque o Estado é laico que o ‘não matarás’ está subvertido”.

No total, a audiência contou com oito convidados, sendo que quatro deles se manifestaram favoráveis e quatro foram contrários à questão. O pastor Abner Ferreira, da igreja Assembléia de Deus, apresentou opinião semelhante à da professora da UnB.

“Qual a diferença de se esfaquear um feto dentro ou fora da placenta?”, indagou. “Se nós permitirmos a descriminalização do aborto, estaremos permitindo o assassinato em larga escala”.

Regina Viola, representante do Ministério da Saúde, informou que no ano passado foram realizados mais de dois mil abortos legais no país. No entanto, ressaltou, os problemas com os abortos inseguros ainda são grandes. “O aborto é a quarta causa de mortalidade materna. Este é um problema de saúde pública, que tem sido enfrentado com muita transparência e disposição”.

Télia Negrão, secretária-executiva da Rede Feminista de Saúde do Rio Grande do Sul, lembrou que, em caso recente, quase 10 mil mulheres poderiam ser julgadas no Mato Grosso do Sul por terem feito aborto clandestino. “Não seria o caso de julgar as pessoas que as estão julgando por terrorismo moral contra essas mulheres?”, disse.

Para Gilda Cabral, do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), mesmo as mulheres que sofrem aborto espontâneo são discriminadas quando vão a um hospital público. “São atendidas igual bicho. São alvo de chacotas dos médicos, enfermeiras e funcionários e, ainda, de pessoas religiosas fundamentalistas que circulam nos hospitais”, afirmou. “Eu mesma vivi esta situação em 1981, quando sofri um aborto espontâneo e fui tratada como criminosa. É desumano”, acrescentou.

O projeto 1.135, de 1991, suprime o artigo 124 do Código Penal, que prevê pena de 1 a 3 anos de prisão para quem comete aborto. O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), apresentou relatório contrário ao projeto, que pode ser votado na próxima semana pela comissão.

Fonte: Folha Online

Comentários