No olho da tempestade

Na semana passada fomos diretamente atingidos, aqui onde moro, pela tempestade de verão que assolou a costa leste dos Estados Unidos e deixou quase 40 mortos e milhões sem energia elétrica. Esse tipo de tempestade, chamada de “derecho” (reto, em espanhol) ao contrario das tempestades que acontecem na Florida e no Caribe todos os anos, é muito difícil de prever e antecipar sua rota e magnitude. Por isso, mesmo com toda a tecnologia de previsão do tempo no país mais rico do mundo, ninguém esperava um estrago tão grande.

Eu estava voltando da escola bíblica de férias em minha igreja, quando notei o céu bem carregado, com muitos raios e trovões. Achei que se tratava apenas de mais uma “thunderstom” (tempestades de verão), tão comuns nessa época do ano. Mas, mal entramos em casa, já percebemos que a coisa era mais séria; meu cunhado , que estava passando férias conosco, e que nunca tinha enfrentado nada parecido, ligou meio que desesperado perguntando o que estava acontecendo. Foi só então que liguei a televisão para tentar ver algum comunicado sobre o tempo, e me deparei com um alerta geral e aviso para que todos procurassem abrigo. Disse para meu cunhado voltar pra casa o mais rápido possível, peguei minha filha e esposa e corri para o “basement” (porão). Meu cunhado que chegou alguns minutos depois, sem saber que estava enfrentando o início de uma das tempestades mais devastadoras e inesperadas dos últimos tempos; Ele relatou um cenário de filme de terror, com arvores caindo pelo caminho, galhos voando pela estrada, ventos de enorme força e visibilidade quase zero.

Aí então é que veio o pior; mal chegamos no basement e a luz apagou. Imagine só, um bando de brasileiros, nordestinos que nunca tiveram que lidar com esse tipo de coisa, tendo que esperar a tempestade passar no escuro, confinados e alheios a tudo. Foi aterrador. Ouvíamos os trovões e o barulho de vento o tempo todo meio que sem saber o que fazer. É costume por aqui, manter um chamado “kit sobrevivência” no basement, para situações como essa, mas como eu além de inexperiente, sou prá lá de desligado, o máximo que encontrei, foi uma lanterna velha, com pilhas meia-vida, e foi o que tivemos naquela noite.

Como não tínhamos nem internet, nem televisão, ficamos totalmente sem noticias e sem saber o que estava acontecendo no resto da cidade; que saudades do velho radinho de pilha… Somente quando as coisas acalmaram um pouco é que criei coragem e fui até o carro tentar ouvir alguma coisa no radio. Os informes não eram muito específicos, mas também não eram nada animadores. Somente no dia seguinte ficamos sabendo um pouco mais dos danos causados pela tempestade.

Graças à Deus não tivemos nenhum prejuízo material ou estrutural em nossa casa, mas alguns amigos e conhecidos não foram tão afortunados. Uma outra família de brasileiros e um colega que ensina na Liberty, tiveram suas casas atingidas por enormes árvores que caíram e derrubaram parte da parede. Felizmente nenhum deles se machucou, mas soube de um casal de idosos que faleceu enquanto dormiam, quando uma arvore caiu bem em cima do quarto deles.

Mas, passado o impacto da tempestade, veio o mais desagradável: ter que conviver com a falta de energia elétrica pelos próximos dias. Ninguém sabia ao certo informar quanto tempo levaria para que a eletricidade fosse restaurada. Alguns chegaram mesmo a cogitar semanas! Os relatos diziam haver inúmeras linhas de transmissão derrubadas e árvores bloqueando o caminho das equipes de reparo. O detalhe é que estamos no meio do verão aqui no hemisfério norte. E ao contrário de que possa se pensar, aqui também faz calor nessa época do ano, e muito! Mesmo para um nordestino como eu, aguentar esse clima sem ar condicionado, ventilador e geladeira foi um sofrimento enorme. Além disso, a falta de energia elétrica desencadeou um cenário de filme-catástrofe, com todo mundo correndo para os supermercados para comprar os últimos pacotes de gelo, as últimas pilhas e os últimos refrigerantes gelados; os postos de gasolina ficaram com filas enormes, com todos irritados e nervosos, achando que não haveria combustível para os próximos dias ou mesmo semanas. Eu mesmo, fiquei quase duas horas numa fila enorme só pra comprar dois sacos de gelo.

O que fez grande diferença nessa situação toda, foi a solidariedade e iniciativa das igrejas evangélicas, que milagrosamente em sua maioria continuaram com energia elétrica. Algumas abriram suas portas e principalmente, mantiveram o ar-condicionado funcionando 24 horas por dia, e ofereceram abrigo para quem quisesse entrar e se refrescar um pouquinho. Nós mesmos fomos todos para minha igreja e lá ficamos o dia todo. Isso me fez pensar em como, apesar de todos os problemas e conflitos que existem, a igreja de Cristo tem e sempre terá um papel fundamental na sociedade, seja proclamando o evangelho, seja levando o amor e a misericórdia de Cristo a quem precisar. Foi literalmente um bálsamo refrescante observar a postura das igrejas locais nesse episódio.

Depois de quase quatro dias, quando já estávamos planejando uma viagem para fugir desse cenário caótico, recebo um telefonema dizendo que a eletricidade havia voltado. Nem acreditei direito e voltei correndo pra casa pra ver se era verdade mesmo. Não dá nem pra descrever a sensação de poder ficar dentro de casa sem transpirar feito uma chaleira, de poder abrir a geladeira, tomar uma água gelada e até mesmo do simples ato de assistir televisão, coisas que nós não damos muito valor no dia a dia.

Quando se passa por uma situação como essa, entendemos como somos frágeis e como a sociedade é, na verdade, como um castelos de cartas, muito fácil de derrubar. Nós pensamos bastante no furacão Katrina que impactou enormemente e de forma incomparavelmente mais severa a vida de milhões de pessoas, que vivendo em um país de primeiro mundo talvez achassem que estariam mais seguras. Como diz a Bíblia: “uns confiam em carros e outros em cavalos, mas nós faremos menção ao nome do Senhor nosso Deus” (Sl 20:7). Não nos iludemos; a única segurança que podemos ter nessa vida, é a certeza da salvação em Cristo.

Um abraço,

Leon Neto

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