Só para pensar um pouco…
Quando Adão se pôs em pé pela primeira vez, finito e infinito se erguiam para uma jornada nova no Universo.
Em relação ao Universo visível, o homem era um ser superior, visto que ele era uma síntese de finito e infinito; e, portanto, sendo essa “síntese” um termo da própria relação que se voltava sobre si mesma e se enxergava: era o nascimento do eu e da autoconsciência em uma das criaturas geradas na Terra: o homem.
Desse modo, a superioridade do homem sobre o Universo decorre do fato do homem saber de si, saber de sua própria existência, ou seja: decorre da consciência e do autoconhecimento.
Assim é que porque há o “eu”, há também o Universo. Do contrário o Universo existiria sem saber de si mesmo. Sim, o homem é superior porque sabe que o Universo existe, e este não sabe disso. Porém, apesar de tal superioridade, é parte dele, existe nele, e depende dele para continuar vivendo e existindo como homem no tempo e no espaço.
Assim existe o homem: entre finitude e infinitude. Todavia, a tal síntese que somos nós perdeu sua harmonia como síntese; e ainda faz síntese, porém é uma síntese angustiada.
Para Adão não bastou ficar em pé como síntese de finito e infinito. Ele tinha tudo na Terra. Mas queria muito mais que isso. A Terra era possível. Tudo era possível. Todas as árvores. Todas as coisas.
O homem necessita do possível para consumo na existência, mas sente carência do impossível, do que está para além dele… Deseja o que é “como Deus”.
Ora, ele tinha Deus. Mas não bastava. A “realização” era desejar ser como Deus. Não bastava carregar o infinito e ter comunhão com Ele. Deus tinha que ser equivalente. O que Deus sabia o homem precisava saber também. Não bastava conhecer o tudo-nada: É. Ele tinha que saber como Deus. Desejava ser Senhor do Bem e do Mal.
Tal salto, todavia, gera a morte, pois quebra a síntese de finito e infinito. A morte em delitos e pecados é a existência com a síntese de finito e infinito “lascada” pela desarmonia gerada pela busca da autonomia da “possível” existência sem carência de Deus.
Buscar saber como Deus é buscar ser Deus sem Deus.
Havia todas as “árvores” no jardim. E também a Árvore da Vida e a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal. Mas a Árvore da Vida perde seu poder de sublimidade para quem já se considera vivo. Assim, a Árvore da Vida não seduz quem quer mais que vida.
O problema para o homem não era o possível da Terra. “De todas as árvores do jardim podes comer…”—lhe fora dito por Deus.
O problema do homem era o impossível dos homens: “Mas não comerás da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal; pois, nesse dia, morrendo, morrerás”.
Até aí o temor segurou os humanos…
No entanto, quando a certeza da morte foi relativizada pela possibilidade do impossível (“…como Deus sereis conhecedores…”), então até a morte perdeu seu poder de deter os humanos.
Nesse caso, a finitude como punição (a mortalidade) é menos forte do que o poder de ser como Deus… Quem sabe?
Assim, a necessidade de viver foi vencida pela perversão do infinito, que se apoiou na estética do fruto (belo aos olhos), na sensorialidade psíquica (bom de se comer, com cara de gostoso), e no apelo à infinitude equivalente à de Deus: conhecer como Deus o Bem e o Mal.
O que aconteceu foi Queda. Pois, fissurando o que antes era “um”, e em plena harmonia em-si, como síntese de finito e infinito, o homem se abismou no Imediato, e isto lhe veio como penalidade, a qual o põe de sol a sol na busca do finito como Necessidade.
Desse modo, originalmente, foi a busca autônoma do infinito aquilo que abismou o homem na Necessidade do finito, fazendo com que sua existência aconteça rastejante e sem consciência de seu próprio eu; posto que a consciência do “eu” é proporcional à carência de infinito.
Dessa mesma forma, quanto mais atida ao finito, menos consciência haverá em uma pessoa. E é por esta mesma razão que um ser humano que vive apenas para as coisas da Necessidade imposta pela tirania do Imediato (que é a pressa da morte), e sem busca de infinitude, torna-se cada vez mais animal e instintual; pois teme arriscar-se no infinito, que é imaterial e intangível.
Nesse caso, a consciência-de-si, o eu, é feito do desespero de anelar o infinito sem a coragem de se entregar a ele!
Assim, quanto mais básico é o homem em sua busca de interioridade e infinitude, tanto menos angustiado e desesperado ele será. Porém, quanto mais carente de eternidade ele se mostre, mais desesperado será, a menos que faça aquilo que a Necessidade finita implora que ele não faça, que é andar pela fé, olhando o invisível, e sendo capaz de deixar de lado todas as imagens e representações de Deus ou de deuses, mergulhando de cabeça exclusivamente na fé que não se apóia em nada que não seja invisível aos olhos, ainda que um dia tais coisas tenham tido sua representação histórica: como o Cristo encarnado, morte e ressuscitado!
A maioria dos cristãos que eu conheço existem em estado de maior dor e sofrimento do que a maioria dos demais humanos. Sim, os cristãos são os seres mais angustiados da Terra.
E por quê?
Porque a Lei os parou num limbo, presos entre finito e infinito, anelando por Deus, porém, de modo finito, tentando agradá-lo por seus próprios méritos.
Ora, o homem “sem Deus no mundo” não costuma ter tais angústias. Mas o cristão-do-limbo, esse muito sofre, visto que está preso entre as duas dimensões: preso à finitude pela Necessidade de Segurança (nesse caso, de religião) e preso à infinitude pela informação da vida eterna, que historicamente a religião cristã deu a ele, especialmente no Ocidente do Planeta.
Mas como o cristão não se entrega ao “impossível para os homens, e que é possível para Deus” (a salvação na graça de Deus), ele vive morrendo, existindo como um desesperado: entre a salvação e angústia da perdição: um confessor da eternidade gemendo as culpas do inferno.
O pior lugar existencial para se existir é entre a Lei e a Graça. Nele a alma se desespera ao extremo. Não é à toa que os maiores angustiados da Terra vivam na banda “cristã” do planeta. É por esta mesma razão que a Psicologia e a Psicanálise nasceram no berço de tais angústias e desesperos da alma ocidental: quase cristã e quase pagã.
No entanto, todo aquele que crê e desiste de saber sobre o Bem, o Mal, a Justiça Própria, a Lei, a Auto-Santificação, a Auto-Iluminação, etc., e apenas mergulha como quem se lança descansado no abismo, confiante no amor de Deus, esse começa a ver finitude e infinitude se reconciliarem nele; e o resultado será o crescimento na direção de uma existência que será cada vez mais Vida.
Isso, porém, só acontece para quem se entrega, pela fé, ao impossível dos homens, que é a salvação humana — visto que é mais fácil fazer qualquer camelo passar pelo fundo de uma agulha do que colocar um filho da Necessidade sob a obediência à fé no Impossível, que é a salvação do espírito.
Ora, esta é também a paz de todo aquele que abandonou a fé na Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal e creu na Vida, que é Cristo, e Ele somente!
Pense nisso!
Caio