Os especialistas muitas vezes tentaram imaginar que proporção dos homens que usam a Internet para obter imagens pornográficas de crianças também as molestam. Um novo estudo governamental de criminosos sexuais condenados indica que a proporção pode ser surpreendentemente elevada: 85% dos criminosos disseram ter cometido atos de abuso sexual contra menores.

O estudo, que ainda não foi publicado, suscitou debate veemente entre psicólogos, policiais e dirigentes de presídios, que não chegam a acordo sobre a maneira pela qual as conclusões devem ser apresentadas ou interpretadas.

A pesquisa, executada por psicólogos do Serviço Presidiário Federal, é o primeiro levantamento em profundidade sobre o comportamento dessa categoria de criminosos, conduzido pelos terapeutas responsáveis por seu tratamento direto no sistema penitenciário. As conclusões a que o trabalho chegou estão sendo divulgadas em caráter privado entre os especialistas, e estes dizem que elas podem ter imensas implicações para a segurança pública e a ação da polícia.

O comércio de pornografia infantil online explodiu, nos últimos anos, e os pesquisadores não sabiam que proporção dos homens que baixam esse tipo de imagem de crianças online são, também, molestadores; alguns especialistas afirmam que o estudo “deve ser divulgado o mais rápido possível”, para identificar homens que alegam estar apenas “olhando fotos” mas, na verdade, vão bastante além.

Mas outros afirmam que os resultados, embora significativos, correm o risco de categorizar alguns homens como predadores de maneira injusta. As conclusões, que se baseiam em trabalho com criminosos condenados que se ofereceram como voluntário para o estudo, não se aplicam necessariamente ao grande e diversificado grupo de adultos os quais, em determinado momento, podem ter baixado pornografia online, e cujo comportamento é variável demais para que uma única pesquisa possa capturar.

A controvérsia se tornou mais intensa quando o serviço penitenciário ordenou, em abril, que o relatório sobre o trabalho não fosse publicado no Journal of Family Violence, uma publicação científica que submete os trabalhos que publica à revisão crítica de outros pesquisadores. O serviço penitenciário aparentemente estava preocupado com a possibilidade de que os resultados fossem interpretados de maneira indevida. Uma porta-voz do serviço informou que um estudo sobre criminosos e pornografia infantil estava sendo revisado, mas não acrescentou outros comentários.

Ernie Allen, que dirige o Centro Nacional de Crianças Desaparecidas e Exploradas, organização criada por determinação do Congresso e bancada majoritariamente por verbas federais para coordenar o esforço nacional de combate à pornografia infantil, disse que estava surpreso por o estudo não ter sido divulgado na íntegra. “Trata-se da espécie de pesquisa sobre a qual o público precisa ser informado”, afirmou.

Outros especialistas concordaram em que o relatório deveria ser publicado, mas demonstraram mais cautela quanto às conclusões. “Os resultados poderiam ter implicações imensas para a segurança da comunidade e as liberdades individuais”, disse o Dr. Fred Berlin, fundador da Clínica de Distúrbios Sexuais na Universidade Johns Hopkins. “Se as pessoas que acreditávamos não serem perigosas o são, precisamos estar cientes disso, e devemos tratá-las de acordo com essa avaliação. Mas, caso estejamos errados, as liberdades delas não serão respeitadas”.

Todos concordam em que os pesquisadores precisam descobrir mais sobre os consumidores de imagens ilegais de crianças obtidas online. O volume de material apreendido em computadores parece dobrar a cada ano, o centro nacional recolheu mais de oito milhões de imagens de pornografia infantil explícita nos últimos cinco anos, e Alberto Gonzalez, o secretário da Justiça, com apoio da Casa Branca, fez da proteção às crianças uma prioridade nacional, promovendo a aprovação da Iniciativa Infância Segura, em 2006.

As pessoas detidas por acusação de posse ou distribuição de pornografia infantil em geral recebem sentenças menos severas do que os criminosos sexuais, e passam por períodos de liberdades condicional mais curtos. Elas não se enquadram a qualquer estereótipo criminal, detenções recentes incluíam políticos, policiais, professores e empresários.

“É crucial compreender a história sexual de todos os esses criminosos, porque ocasionalmente o crime pelo qual tenham sido detidos representa apenas o topo do iceberg, e não representa seus padrões de atividade e interesses reais”, disse Jill Levenson, professora assistente de serviços humanos na Universidade Lynn, em Boca Raton, Flórida, e diretora de ética na Associação para o Tratamento dos Criminosos Sexuais.

Os psicólogos que conduziram o novo estudo, Andres Hernandez e Michael Bourke, se concentraram em 155 detentos que se ofereceram como voluntários para tratamento em uma penitenciária federal em Butner, Carolina do Norte, de acordo com uma versão do trabalho obtida pelo New York Times junto a especialistas externos que desejam que o estudo seja publicado.

A clínica de Butner é a única dedicada ao tratamento de criminosos sexuais no sistema penitenciário federal. Os detentos participantes do estudo todos estavam servindo sentenças por posse ou distribuição de pornografia infantil, e não por molestar crianças fisicamente.

Os terapeutas encorajaram os participantes a revelar, anonimamente, quaisquer crimes sexuais mais graves que não tivessem sido revelados em seus julgamentos, e depois compararam essas revelações aos registros de crimes dos detentos quando de seus julgamentos. De acordo com a comparação, 85% dos detentos admitiam abusos físicos contra pelo menos uma criança antes de sua prisão, ante apenas 26% no cômputo realizado quando de suas detenções.

Fonte: Terra

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