O avanço na questão da segurança no Iraque deve ser o tema principal de um encontro entre o primeiro-ministro iraquiano, Nouri Al Maliki, e o papa Bento 16, no Castelo Gandolfo, residência de verão do pontífice, localizada cerca de 30 km ao sul de Roma, nesta sexta-feira.

“Essa é uma preocupação antiga, desde o início do papado de Bento 16. Em agosto de 2005, o papa se encontrou o ministro das Relações Exteriores iraquiano para expressar preocupação não só com os católicos, mas com todos os cristãos no Iraque”, afirmou à BBC Brasil o porta-voz da rádio vaticana Luiz Badilla.

Não existem estatísticas confiáveis, mas a maior parte das estimativas calculam que pelo menos metade dos cristãos no Iraque, que compunham 5% da população do país, ou 1,5 milhão de pessoas segundo um censo de 1997, deixou o país desde o início da invasão comandada pelos Estados Unidos em 2003.

“Metade foi embora e a outra vive com medo”, disse à BBC Brasil Suha Rassam, iraquiana, autora do livro Christianity in Iraq: Its Origins and Developments to the Present Day.

“A menos que entremos em um período considerável de segurança física e prosperidade material, não vejo muitas dessas pessoas retornando ao Iraque.”

Violência

O episódio mais famoso de violência contra cristão no país ocorreu em março deste ano, quando Paulos Faraj Rahho, arcebispo caldeu da cidade de Mosul, foi encontrado morto após ter sido sequestrado dias antes.

Os caldeus são um dos ramos mais antigos do cristianismo. Suas cerimôminas religiosas são feitas em aramaico, o mesmo idioma que se supõe que Jesus Cristo e seus apóstolos falavam.

Muitos analistas acreditam que, por compartilhar da mesma religião dos invasores americanos (embora pertençam a ramos diferentes da cristandade) os cristãos iraquianos foram alvo de ódio de outras comunidades.

“É inegável que, ao contrário de outros grupos, os cristãos não dispunham de milícias para os proteger”, opina Ninos Warda, diretor executivo do Assirian Council of Europe, grupo de pressão que defende os interesses da minoria assíria (muitos deles cristãos iraquianos) no Parlamento Europeu.

Para ele, a violência é fruto de uma combinação de fatores que surgiram com a guerra, como pobreza, desespero e influência de estrangeiros que entraram no Iraque.

Mesmo assim, Warda crê que uma reconciliação entre as comunidades não é impossível. “A diminuição em termos gerais da violência no Iraque nos últimos meses é bastante positiva”, diz.

Apesar de a acadêmica Suha Rassam dizer acreditar que a volta dos cristãos já exilados é improvável, ela afirma que a comunidade já enfrentou momentos piores no passado.

“Os cristãos já sofreram momentos extremamente duros, desde o século 4. Existem documentos de massacres ocorridos nos séculos 13, 14 e 19, ainda mais graves do que os atuais”, diz ela.

Além do assassinato do líder religioso, muitos outros incidentes contribuíram nos últimos anos para aterrorizar os cristãos iraquianos. Em um único dia de agosto de 2004, por exemplo, cinco igrejas foram alvo de atentados a bomba em diferentes partes do país.

“Eu estava em uma delas, a igreja de Karrada (um bairro de Bagdá), com meu filho menor quando o carro bomba explodiu do lado de fora”, disse a iraquiana Jamila, que desde outubro daquele ano vive como refugiada na capital do Egito, Cairo.

“Ninguém morreu, mas muitos se feriram com os pedaços dos vitrais que caíram para o lado de dentro. Eu e meu garoto de oito anos vimos o olho de uma garota ser arremessado para fora de sua órbita”, disse ela, que cita o episódio como apenas mais um dos vários que a motivaram a deixar seu país.

Tanto ela como o engenheiro Fadi são exemplos de representantes da educada classe média iraquiana que se viram obrigados a trabalhar em empregos menos qualificados no Cairo para fugir da violência em sua terra natal.

“Não vejo um futuro para os cristãos no Iraque. A maioria está fora, e quem está dentro quer sair”, diz ele que, assim como Jamila, afirma acreditar que nunca mais voltará ao seu país.

Não é o fim

Mas sair não é sempre fácil e, raramente, o fim dos problemas. Além de dinheiro e sorte, necessários para se cruzar a fronteira, é necessário ter para onde ir.

Os países vizinhos do Iraque (especialmente Síria, Irã e Jordânia) se dizem sobrecarregados pelo enorme número de iraquianos que entraram em seus territórios, e por isso vêm endurecendo as restrições para novos refugiados.

A iraquiana Fatima, no entanto, se deparou com um problema diferente quando, do Egito, tentou ser transferida para os Estados Unidos, em 2006.

Ela veio de Bagdá à capital egípcia em setembro daquele ano após o marido, muçulmano, ter sido seqüestrado e torturado por duas semanas, por supostamente ser casado com uma cristã.

Seu pedido de visto foi negado pelo governo americano, que alegou que o resgate pago por ela aos seqüestradores caracterizava auxílio prestado a organizações consideradas terroristas.

Só após uma batalha legal de quase dois anos, na qual contou com o apoio de organizações estrangeiras, ela conseguiu embarcar para os Estados Unidos.

Fonte: BBC Brasil

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